A inércia silenciosa: por que é tão difícil defender o posicionamento de marca nas empresas
Apesar de ser uma das engrenagens mais poderosas do crescimento sustentável, o posicionamento de marca continua sendo um dos investimentos mais negligenciados dentro das empresas.
A razão é simples e dura: não há retorno imediato. E, em tempos de pressão por resultados trimestrais, aquilo que não entrega ROI em 90 dias raramente conquista o espaço - e o orçamento - que merece.
O paradoxo do não-posicionamento
Quando o posicionamento não é tratado como prioridade, ele não desaparece. Ele apenas se constrói de forma acidental, pela força do hábito, da operação e da narrativa imposta por terceiros (concorrentes, mercado, imprensa). Ou seja, a marca vai sendo percebida — mesmo sem intenção — de maneira pouco estratégica e frequentemente desalinhada com os objetivos do negócio. É como um terreno que, por falta de projeto, vai sendo ocupado por construções improvisadas. No fim, ergue-se algo, mas quase nunca o que se imaginava.
Por que a liderança não compra a ideia?
Muitos executivos ainda encaram o posicionamento como algo periférico ou "bonito de se ter", mas não essencial ao core do negócio. Isso se deve a uma série de fatores:
Primeiro, por ser intangível e subjetivo, o posicionamento de marca escapa da lógica linear de causa e efeito. Seu impacto se dá em cadeia, ao longo do tempo, tornando difícil demonstrar retorno direto com precisão.
Segundo, ele conflita com urgências operacionais. Em um cenário onde há sempre um problema a resolver ou um número a bater, parar para discutir posicionamento parece luxo ou, pior, perda de tempo e desvio de foco. Mas é justamente essa ausência de pausa estratégica que impede o amadurecimento da empresa no longo prazo.
Por fim, há o histórico de iniciativas vazias. Muitas organizações já passaram por rebrandings mal conduzidos, que geraram muito barulho e pouca transformação, criando um ceticismo interno profundo. Nessas empresas, qualquer menção à marca é vista como custo, e não como investimento.
Como despertar interesse e criar latência para o posicionamento?
Diante desse cenário, algumas estratégias têm se mostrado eficazes para iniciar a conversa sobre posicionamento dentro da empresa, mesmo em ambientes resistentes:
Uma delas é usar a narrativa de risco versus oportunidade. Em vez de falar apenas de benefícios abstratos, aponte os riscos reais de não fazer nada: confusão no mercado, dificuldade de atrair talentos, perda de margem por falta de diferenciação, entre outros. Mostre que não se trata apenas de crescer, mas de sobreviver.
Outra abordagem eficaz é apresentar benchmarks e casos reais. Quando bem escolhidos — e de preferência do mesmo setor ou com desafios semelhantes — eles funcionam como um espelho. O exemplo da transformação da Havaianas, que saiu do território da commodity para um ícone de desejo global, ou da Magalu, que redesenhou sua proposta de valor com base em posicionamento digital, são bastante didáticos.
Também vale sugerir testes controlados e pilotos, que permitam experimentar a lógica de posicionamento em um canal, campanha ou público específico. Isso gera aprendizado, reduz o risco e ajuda a tangibilizar o impacto para os céticos.
Por fim, vincule tudo isso a metas concretas do negócio. Posicionamento não é apenas estética ou discurso: ele influencia margem, NPS, engajamento, taxa de conversão e até atração de talentos. Leve dados à mesa, mesmo que imperfeitos, e conecte o tema aos indicadores que já importam para a liderança.
Argumentos-chave para defender o investimento
Insistir no valor do posicionamento exige coragem e pragmatismo. E argumentos robustos. Aqui estão três deles:
Uma marca forte reduz o custo de aquisição de novos clientes. Quando a percepção do cliente já está calibrada, menos esforço é necessário para convencê-lo. Isso significa menos dependência de promoções, SDRs e campanhas empurradas.
Ela também melhora a retenção de talentos. Profissionais querem se associar a marcas com propósito claro, visão coerente e cultura forte. Isso impacta clima organizacional, turnover e produtividade.
Por fim, uma marca bem posicionada facilita decisões estratégicas. Ela se torna uma bússola. Com clareza de quem se é e para quem se serve, fica mais fácil decidir o que lançar, onde entrar, com quem se aliar.
Retornos esperados em diferentes horizontes
Curto prazo (3-6 meses): Nos primeiros meses, o que se observa é um efeito de alinhamento interno. As equipes começam a falar a mesma língua, o discurso institucional ganha clareza e as comunicações se tornam mais coesas. É comum também ver aumento de engajamento em canais próprios e uma percepção interna mais positiva.
Médio prazo (6-18 meses): A marca começa a ganhar tração externa. Buscas orgânicas aumentam, menções se multiplicam e há maior facilidade para fechar parcerias ou atrair talentos. Algumas métricas de performance comercial também começam a reagir, especialmente nos canais digitais e na conversão de leads mais qualificados.
Longo prazo (18+ meses): Aqui, o posicionamento amadurece e começa a consolidar valor. As margens melhoram, o CAC tende a cair e a marca se torna uma plataforma estável para expansão, seja em portfólio, seja em território. O ativo intangível se manifesta de forma tangível: em lucro, valuation e reputação.
Lembre-se: se sua empresa tivesse começado há algum tempo atrás, já estaria colhendo os benefícios. Sempre - ou quase sempre - há tempo.
Faça sentido antes de fazer barulho.
Nos vemos em breve!